segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Comunicado de Imprensa


Tantas horas de Conselho de Estado para nada

Quando o país esperava que o Conselho de Estado o percebesse, este fechou os olhos. Para quem se manifestou a 15 de Setembro e esteve nas vigílias de 21 de Setembro, os problemas deste país não se resolvem pelo facto de o governo passar a tirar-nos de outra maneira aquilo que nos roubava na TSU. Ao conquistarem as ruas das suas cidades sob o lema “Que se lixe a troika! Queremos as nossas vidas!”, centenas de milhares tomaram uma posição firme de denúncia de um programa, o da troika, de um governo, o dos troikistas, e de um método anti-democrático, o de sujeitar a população portuguesa a politicas que as pessoas não discutiram nem votaram.

Os resultados comunicados ao país, após mais de oito horas de reunião, apenas sugerem, sem concretizar, um possível recuo na subida da TSU para os trabalhadores. Não nos congratulamos por isso: consideramos grave a avaliação de que sem o protesto cívico não se teria alterado sequer esta aberrante medida. Congratulamo-nos, antes, pelos milhares de pessoas que fizeram exercício da sua participação política, muitas intervindo pela primeira vez e muitas outras reiterando protestos desencadeados em diversos sectores da sociedade, face aos sucessivos cortes nos rendimentos do trabalho e nas reformas, na Saúde, na Educação, na Cultura, as privatizações das companhias fornecedoras de gás e electricidade, os consequentes aumentos de preço e do IVA, o agravamento de custos e as limitações às redes dos transportes públicos. Os problemas do país não se resolvem com estas medidas de austeridade. A resolução passa por dar voz ao povo, para que decida em conjunto como garantir um país justo, defendendo os interesses de quem cá vive e trabalha e invertendo cruéis assimetrias em prol de subservientes acordos assumidos com a troika.

O Conselho de Estado – em que não se garante, de maneira alguma, uma verdadeira representação do espectro político português – revelou os mesmos defeitos de cegueira e surdez à voz do povo, característicos do governo, desrespeitando e reinterpretando a seu gosto estes últimos e inequívocos protestos, num texto paupérrimo e vazio, uma manobra de bluff político. Confirmámos assim que não é apenas o governo quem vira as costas ao seu povo. O incansável protesto da multidão demonstrou que, nitidamente, também o Presidente da República perdeu por completo o respeito dos cidadãos e das cidadãs que vivem e trabalham neste país.

É por isso necessário que continuemos a protestar. É cada vez mais urgente traçar um novo rumo. Um rumo que tenha finalmente as pessoas como centro das atenções, e não bancos e mercados ou interesses financeiros e especulativos. Um rumo que reforce a participação democrática e cidadã e não nos limite a vulgares espectadores de uma tragédia colectiva, ditada de gabinetes e de bolsas. Um rumo que aponte para uma verdadeira solidariedade internacional, numa mudança de regime que beneficie todos os povos, e que começa cada vez mais a ser desenhado por plataformas e acções que apelam à convergência cívica em vários países e designadamente à construção de uma nova Europa. Ao contrário do primeiro-ministro Passos Coelho que considerou ser de menor importância uma reunião de governos de Itália, Grécia, Espanha e Irlanda e Portugal para discutir as politicas europeias, nós achamos fundamental que os povos da Europa ajudem a traçar políticas para desenvolver a economia e o emprego em vez de planos para garantir e multiplicar os lucros dos especuladores e agiotas que jogam com as dívidas soberanas.

Consideramos ainda premente, para o nosso país e para as nossas vidas, que as cidadãs e os cidadãos esqueçam eventuais e pontuais divergências e se unam, se solidarizem e se juntem a outras forças organizadas e aos movimentos que recusam este rumo, numa frente de resistência comum. Apelamos por tudo isto à participação massiva no protesto entretanto convocado pela CGTP-Intersindical para o próximo sábado, dia 29 de Setembro. Juntos reclamaremos esse novo rumo, que inverta totalmente a sujeição do governo aos joguetes políticos de entidades não sufragadas, que cinicamente nos impõem “ajudas” com juros fatais e sacrifícios que jamais ousariam sequer imaginar para si próprios. Um rumo onde não cabem a troika nem os troikistas.

Queremos as nossas vidas.
E por elas estamos dispostos a fazer, em cada dia de luta, em cada novo protesto, algo de extraordinário.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012


Pelo direito de cidadania activa

A 15 de Setembro, um grupo de cidadãos e cidadãs decidiu lançar um apelo à sociedade portuguesa para que se manifestasse nas ruas de Lisboa, em protesto contra o rumo imposto por orientações externas impostas sem sufrágio democrático - pela Troika - e contra o modelo de governação vigente. Mais de 40 cidades responderam espontanea e autonomamente a este apelo. Realizou-se o que muitos dizem ter sido “o maior protesto de massas desde o 25 de Abril”. Um milhão de vozes exerceu o seu direito de cidadania e expressou claramente a sua indignação e o seu protesto. Foi claramente qualquer coisa de extraordinário.

O activismo e a participação civica e política são garantias constitucionais em quase todos os países. Todavia, o modelo de governação vigente na maioria dos países ditos democráticos tem vindo a sofrer profundas alterações e condicionalismos decorrentes da interferências de interesses económicos e financeiros sem responsabilidade democrática, de agentes e instituições supra- nacionais não sufragadas e de clientelismos e corruptelas de gravidade diversa.

Estas modalidades de ingerência nos regimes democráticos de muitos países têm conduzido ao agravamento de uma crise económica de larga escala, nomeadamente a nível europeu, e, apesar de conhecidos os mecanismos e os responsáveis por este desenlace, as soluções apontam apenas para o agravamento das condições de vida dos povos e do planeta, agravam o desemprego e a precariedade e fragilizam os direitos laborais e cívicos de cidadania.

Acresce que todo este clima de imposição de políticas de austeridade tem trazido consigo o crescimento de medidas de repressão e de limitação dos direitos políticos dos cidadãos e das cidadãs: a detenção e repressão policial de manifestantes, a proibição ou a limitação de protestos no espaço público, a regulamentação restritiva do exercício político cidadão ou o encerramento de espaços e a perseguição a colectivos de activistas.

Na Grécia, durante o último ano, são bem conhecidas a brutalidade e a repressão generalizada de diversos protestos populares; em Inglaterra, o processo Julian Assenge revelou-se paradigmático do modo de limitação do direito de informar e de expressão; no Egipto, depois da brutalidade sobre os manifestantes que clamavam liberdade e democracia sucedeu-se uma forte perseguição a activistas e cyberactivistas; na Rússia, o caso Pussy Riot terminou numa pena de prisão injustificável; e, na África do Sul, a matança horrível de civis grevistas demonstra que os últimos tempos estão muito distantes do respeito pelos Direitos do Homem, da Liberdade de Expressão ou da participação cidadã livre e democrática.

Nos últimos dias, em Espanha, vários manifestantes no dia 15 de Setembro foram detidos injustificadamente por protestarem nas ruas das suas cidades. A Plataforma Afectados pela Hipoteca, parte da Cumbre Social, que coliga mais de 900 organizações, já repudiou as detenções. Colectivos foram desalojados sem aviso prévio nem processos pendentes apenas para limitar a sua capacidade mobilizadora e actuante. Em Portugal, ressalve-se que a polícia cumpriu a 15 de Setembro o seu dever de acompanhar a segurança dos manifestantes, e a fotografia do abraço entre uma activista em protesto e um agente em trabalho correu mundo; no entanto, agravam-se as medidas de prisão ou os julgamentos sumários sobre manifestantes que praticam actos de desobediência civil ou simplesmente convocam protestos. A criminalização do protesto, como bem refere o comunicado do colectivo RDA69, é uma doença que contamina as democracias. É preciso combatê-la. Já.

Paralelamente, a justiça opera com extrema lentidão e dificuldade nos chamados crimes de “colarinho branco”, de corrupção, de desvio ou de branqueamento de capitais, cujos desfechos são frequentemente a absolvição, a anulação ou o arquivamento dos processos.

O direito à cidadania activa impõe-se e é urgente, e as grandes manifestações do passado sábado, em Portugal ou na Espanha, demonstram que os cidadãos e as cidadãs sabem exercer os seus direitos responsavelmente, mesmo que com firmeza e indignação, e que a sua voz não deve ser calada ou aprisionada, sob o manto persecutório e paranóico da ameaça terrorista.



Acordai, Conselho de Estado!

No sábado passado, 15 de Setembro, fizemos qualquer coisa de extraordinário. A força daqueles e daquelas que saíram à rua por todo o país mostrou que em conjunto podemos mudar aquilo que está mal. Podemos fazer algo de extraordinário. Hoje estamos aqui junto ao Palácio presidencial porque sentimos que existe uma manifesta vontade popular de mudança de governação, e queremos que o Conselho de Estado aqui reunido sinta que o mal-estar de toda uma população não se compadece com decisões messiânicas ou gratuitas, avulsas ou remendadas. A assimetria dos sacrifícios impostos aos Portugueses e a todos os que vivem e trabalham neste país, a manifesta explosão da pobreza e do empobrecimento do país, a desigualdade na distribuição da riqueza têm sido agravadas com a implementação de políticas de austeridade que se tornam verdadeiros saques às nossas vidas. E por isso é preciso pensar num novo rumo.

No sábado clamámos, dignamente e bem alto, que queríamos as nossas vidas de volta. Hoje, sublinhamos que estamos definitivamente fartos e fartas deste modelo de governação submetido aos interesses financeiros e às especulações de mercado. E não nos contentamos com mudanças cosméticas de cadeiras, com governos mais suavemente austeritários ou com recuos em medidas pontuais. Quando não existe respeito pelo povo, quando apenas existe imposição e mentira, quando apenas existem medidas executadas à revelia da vontade do povo e instituições não eleitas que tudo decidem, quando temos uma troika que entra no nosso país “emprestando” 78 mil milhões mas cobrando 36 mil milhões em juros, quando aqueles que nos governam se tornam, como diria Padre António Vieira, em gente que não vem cá buscar o nosso bem, vem cá buscar os nossos bens, então, essa é a altura de dizer: Não! A escala do termómetro da nossa paciência e da tolerância à mentira política, à injustiça social e à destruição da economia foi largamente ultrapassada. Este governo, estes governantes, não têm mais qualquer base de apoio popular e não podemos continuar a ser carne para canhão dos seus manuais técnicos e dos seus modelos teóricos que insistem em que temos de ficar pobres, que temos de ser baratos, que temos de ser entregues à lei da selva.. Concretizar o nosso protesto de sábado e exigir em uníssono que este governo da troika – este governo mais troikista que a troika – se demita é uma óbvia conclusão. Por isso, aqui hoje reiteramos: não queremos mais troika, nem modelos de governação troikistas! A troika não resgata. A troika afunda-nos e esmaga-nos. A troika e as suas medidas de austeridade não funcionam. Não funcionam aqui, não funcionam em Espanha, não funcionam na Grécia, não funcionam na Irlanda, não funcionam em Itália. Não funcionam no Chipre. Não funcionam na Letónia. Já foram testadas e nunca funcionaram. As manifestações foram o cartão vermelho a todas as políticas de austeridade deste governo, mas também de qualquer governo que pretenda, mudando de nomes e de modos de fazer, aplicar medidas como estas. E que a rejeição da austeridade europeia seja a exigência de uma outra Europa.

Não somos mais Portugueses suaves, somos cidadãos e cidadãs conscientes, lúcidos, comprometidos com a mudança e que querem, exigem, as suas vidas, dispondo-se a fazer coisas extraordinárias para que isso possa acontecer de um modo verdadeiramente democrático.
Acordai, portanto, Conselho de Estado!

Que se Lixe a Troika! Que se Lixem os Troikistas! Queremos as Nossas Vidas! E vamos tê-las de volta porque despertámos em conjunto para a participação cidadã. Hoje é mais um dia do resto da nossa luta.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

15 de Setembro: Qualquer coisa de extraordinário



(imagem de Artigo 21º)

Hoje fizemos qualquer coisa de extraordinário


Texto lido no final da manifestação de 15 de Setembro, na Praça de Espanha


Hoje fizemos qualquer coisa de extraordinário. Estamos a fazer. Esta manifestação são todos vocês que aqui estão. Ela começou num apelo de um grupo de cidadãos e cidadãs, de várias áreas de intervenção e quadrantes políticos, que quiseram contribuir para uma forte e alargada mobilização contra a troika, os troikistas e as politicas de austeridade que insistem em impor-nos. A força daqueles e daquelas que saíram à rua por todo o país mostra que juntos podemos mudar aquilo que está mal. Podemos fazer algo de extraordinário.

Estamos na rua, aqui, em Angra do Heroísmo, Aveiro, Barreiro, Beja, Braga, Bragança, Caldas da Rainha, Cascais, Castelo Branco, Castro Verde, Coimbra, Covilhã, Évora, Faro, Figueira da Foz, Funchal, Guarda, Guimarães, Lamego, Leiria, Loulé, Marinha Grande, Mogadouro, Moncorvo, Nazaré, Nisa, Odemira, Peniche, Ponta Delgada, Portalegre, Portimão, Porto, Santa Maria da Feira, Santarém, Setúbal, Sines, Tomar, Torres Novas, Torres Vedras, Viana do Castelo, Vila Real, Viseu, e pelo mundo fora, em Barcelona, nos Estados Unidos e Canadá, Fortaleza (no Brasil), Macau, Londres, Paris e até em Bruxelas e Berlim.

De acordo com os dados que conseguimos, saíram à rua perto de 1 milhão de pessoas. Estamos de facto nas ruas a fazer qualquer coisa de extraordinário e com uma mensagem clara: queremos as nossas vidas de volta, sem negociação, sem paninhos quentes, simplesmente a vida com dignidade.
É extraordinário mostrar-lhes que não, não nos resignamos. Não acreditamos que seja inevitável a miséria para onde nos querem atirar: a miséria da falta de pão, da casa que se perde; a miséria da precariedade, do trabalho que nos roubam, do direito a um trabalho digno que nos é negado; a miséria dos transportes que aumentam, do passe que já não podemos pagar e que era preciso só para ir à escola ou ao trabalho - a nossa escola pública que nos querem roubar, como nos querem roubar o direito a estar doentes e a ter um tratamento digno no serviço de Saúde pública, que é nosso.
E a cultura? E a água? E tudo o resto?

Esta manifestação é o princípio de muitas outras coisas.
É urgente uma cidadania desperta e mobilizada.
É urgente tomarmos a mudança nas nossas mãos.
O nosso protesto e o nosso encontro pode e deve ser feito em todos os locais das nossas vidas: no trabalho, no bairro, na escola, em casa.
De uma vez por todas, vamos mostrar que sabemos unir-nos. Vamos participar activamente para que nunca mais ninguém nos desgoverne.
É urgente desobedecer.
Quando não existe respeito pelo povo, quando apenas existe imposição e mentira, quando apenas existem medidas executadas à revelia da vontade do povo e instituições não eleitas que tudo decidem, essa é a altura de dizer: Não!
Todas as lutas e combates serão vitais.

Já estávamos quase a atingir o ponto de ebulição, mas a disparatada e violentíssima comunicação ao país do primeiro-ministro e as desastrosas e gravíssimas medidas anunciadas pelo ministro das Finanças rebentaram com a escala do termómetro da nossa paciência e da tolerância à mentira política, à injustiça social e à destruição da economia.
Para este governo não interessa que as suas políticas só sirvam para provocar a miséria. Para este governo a realidade é que está enganada. Os seus manuais técnicos e os seus modelos teóricos dizem que nós temos de ficar pobres, que nós temos de ser baratos, que nós temos de ser entregues à lei da selva. Que nós temos de ser sacrificados e sacrificadas para que eles – essa entidade abstracta, que tudo pode sobre as nossas vidas – para que eles possam cumprir um programa encomendado, que mais não faz do que asfixiar a economia, aumentar o desemprego e as desigualdades, destruir os bens comuns.
Vamos concretizar o nosso protesto e exigir em uníssono que este governo da troika – este governo mais troikista que a troika – se demita!


Mas não pode ser só isto.

Não queremos substituir este governo da troika por outro governo da troika, nem mesmo em versão suave.
A troika não ajuda. A troika não resgata. A troika afunda-nos, mata-nos, esmaga-nos. A troika e as suas medidas de austeridade não funcionam. Não funcionam aqui, não funcionam em Espanha, não funcionam na Grécia, não funcionam na Irlanda, não funcionam em Itália. Não funcionam no Chipre. Não funcionam na Letónia. Já foram testados e nunca funcionaram. A austeridade nunca funcionou em parte alguma do mundo e nunca funcionará..
Esta nossa manifestação – estas nossas manifestações –   é o cartão vermelho a todas as políticas de austeridade deste governo, mas também de qualquer governo que pretenda, mudando de nomes e de modos de fazer, cheio de falinhas-mansas, aplicar medidas como estas.
Hoje, juntámo-nos para exigir que se rasgue o acordo com a troika, em má hora chamado memorando de entendimento.

Hoje, dizemos que não permitiremos que medidas de austeridade e de saque nos roubem as vidas para salvar bancos, para aumentar contas em paraísos fiscais, para injectar milhões nos grandes grupos económicos.
Unidos e unidas, exigimos que, de uma vez por todas, seja recusado o Memorando da troika, que nos tem conduzido à miséria, à bancarrota, ao caos nas nossas vidas. E que a rejeição da austeridade europeia seja a exigência de uma outra Europa.

E não estamos sós. Também em Espanha se gritou hoje nas ruas “BASTA!” E amanhã o coro de vozes será ainda mais ensurdecedor: Grécia, Espanha, Irlanda, Itália, Portugal, todas as vozes juntas para gritar ao mundo que dentro de gabinetes há gente com nomes e caras que decreta medidas que nos escravizam e nos matam, que governa contra nós como se em nosso nome fosse.
Gente que, como diria o Padre António Vieira “não vem cá buscar o nosso bem, vem cá buscar os nossos bens”.


Amanhã estaremos presentes nas várias acções de protesto da sociedade portuguesa. Nesta etapa da nossa luta, é fundamental dar força a uma greve geral. Uma greve em que, por todo o lado, gente de todos os sectores do trabalho, pessoas contratadas, precárias ou desempregadas, faça parar o país e diga de uma vez por todas: "Basta! Não somos números a engrossar contas bancárias. Temos vidas. Não somos um rebanho manso que come e cala. Parem de brincar connosco. Parem de roubar-nos o nosso trabalho e a nossa dignidade!"

E é importante que seja uma greve popular. Uma greve das pessoas, para as pessoas, que são ameaçadas e chantageadas a não parar, como se fossem máquinas. Comprometemo-nos por isso a fazer todos os esforços para ajudar a construir uma greve geral popular, dinamizada pelos sindicatos com a população e a sociedade civil, que seja capaz de parar todo o país em união contra o desastre que nos é imposto.

Mas mais: resistir é o nosso dever. Menos que isso seria desistir das nossas vidas. É preciso organizar-nos na resistência. É preciso organizarmo-nos na resposta. Localmente, entre amigos/as e vizinhos/as, com colectivos, com organizações que existem e com organizações que irão ser criadas pela força da nossa revolta e da nossa determinação. Comprometemo-nos a apoiar esta greve, esta resistência e esta resposta, e a demonstrar, como hoje fizemos, que pessoas que não concordam em tudo se podem unir por uma causa. E a causa hoje são as nossas vidas.É importante que esta luta ignore fronteiras e que assuma, como hoje, uma dimensão ibérica, europeia, internacional.

No próximo dia 21 de Setembro, ao final da tarde, decorrerá um Conselho de Estado convocado pelo Presidente da República. É importante que, nessa altura, possamos estar concentrados/as em Belém para relembrar que exigimos a demissão deste Governo e que não aceitamos qualquer “solução” que siga os mandamentos da Troika. Governo - Rua! Troika - RUA!

Que se Lixe a Troika! Que se Lixem os Troikistas! Queremos as Nossas Vidas! E vamos tê-las de volta porque hoje é o primeiro dia do resto da nossa luta.

Concentração: Reunião do Conselho de Estado




No dia 15 de Setembro o país tomou as ruas para dizer BASTA!, naquelas que foram as maiores manifestações populares desde o 1º de Maio de 1974. Exigimos o rasgar do memorando da Troika e a demissão deste governo troikista.
Se o governo não 
escuta, que escute o Presidente da República e o seu Conselho de Estado.
Não é não!
Não queremos apenas mudanças de nomes, queremos mudanças de facto. A 21 de Setembro iremos concentrarmo-nos junto ao Palácio de Belém para demonstrar que 15 de Setembro não foi uma mera catarse colectiva, mas um desejo extraordinário de MUDANÇA DE RUMO!
A Luta Continua!
Que se Lixe a Troika! Que se Lixem os Troikistas! Queremos as Nossas Vidas!

Convocadores da manifestação "Que se Lixe a Troika" apelam a vigília ao Conselho de Estado



No dia 15 de Setembro, centenas de milhares de portugueses e portuguesas tomaram as ruas das suas cidades. As mais de 40 manifestações que ocorreram em todo o país foram uma expressão determinada de uma recusa: a população residente em Portugal não quer as políticas da troika em Portugal. Os subscritores e as subscritoras do manifesto "Que se lixe a troika! Queremos as nossas vidas!", que convocou as manifestações, sabem que a mobilização impressionante que aconteceu no sábado, a maior onda de mobilizações desde o 1º de Maio de 1974, se deve a todas as pessoas que fizeram sua esta ideia. As pessoas que saíram à rua querem ser donos e donas do seu futuro. E deixaram bem claro nas ruas das suas cidades que exigem a saída da troika de Portugal e a demissão de um governo mais troikista que a troika, que mais não faz que impor, a coberto da crise, uma política que rouba a muitos para dar a muito poucos.

Quase um milhão de pessoas nas ruas de várias cidades de Portugal e doutros países (junto à sede de embaixadas portuguesas) são um grande sucesso, mas não são ainda uma vitória. Só se cumprirá a vontade de todas e todos que se manifestaram quando este governo for demitido e o memorando da troika rasgado. Para isso é preciso fazer um grande caminho. Os organizadores e as organizadoras da manifestação apoiarão, como cidadãos e cidadãs, todas as lutas nesse sentido, da mais pequena à maior: desde as concentrações sectoriais às grandes manifestações convocadas pelos sindicatos para as próximas semanas, passando pelo apelo lançado publicamente na manifestação a uma vígilia para a próxima sexta-feira, frente ao Conselho de Estado, no Palácio de Belém, exigindo o fim deste governo e de qualquer outro governo de austeridade, como ficou expresso popularmente. Comprometemo-nos ainda a fazer todos os esforços para ajudar a construir uma greve geral de forte adesão popular, que seja capaz de parar todo o país, em união contra o desastre que nos é imposto.

sábado, 15 de setembro de 2012

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Comunicado - Desmentido da notícia do Público


 Acerca da notícia do Público de hoje, os subscritores e as subscritoras do apelo do 15 de Setembro querem reafirmar a sua posição que não está devidamente expressa nesta notícia.  A mensagem transmitida foi deturpada.
 O apelo à manifestação de amanhã é de natureza pacífica. É a expressão da revolta de milhares de pessoas contra a política da troika e...
 deste governo que a serve. Os organizadores tudo farão para atingir este objectivo político. Os activistas não são nem serão polícias de outros activistas. A sua convicção e vontade expressa-se pelas palavras e pela forma como participarão nas grandes manifestações de amanhã. Frisamos ainda que ao contrário do que é dito pelo mesmo jornal o percurso foi definido politicamente e não houve qualquer alteração.

Vamos Fazer a maior Caçarolada de Sempre!


Que se Lixem a Troika e este Governo

É impossível parar a onda de indignação que varre o país desde o anúncio feito pelo Governo no dia 7 de Setembro. Neste dia as circunstâncias políticas mudaram radicalmente. Neste dia caiu o último fio do pano que restava na frente das pessoas que ainda acreditavam que a austeridade era necessária. Os cidadãos e cidadãs que ainda acreditavam nos sacrifíc
ios que estavam a fazer, compreenderam, finalmente, que todos estes estão a ser cometidos não para resgatar o país, mas sim para cumprir um plano ideológico brutal que quer transformar Portugal num canto de produção miserável, onde os trabalhadores não são remunerados pelo seu trabalho, e, onde o investimento se fará através do apelo à escravatura moderna: a precariedade.
Os milhões de pessoas que viram aquele anúncio, depois de um discurso enérgico na festa do PSD onde o PM anunciava a retoma económica para 2013, não acreditaram quando PPC lhes disse que afinal em 2013 lhes ia roubar um salário, para sempre. Foi o momento mais importante para mudar a consciência social de milhões de portugueses e o Governo percebeu isso, mas, mesmo assim, insiste. E insiste porque o plano da Troika e o plano deste Governo só pode ser feito de uma forma: contra a vontade de todos e todas.
É por isso que é preciso fazer algo de extraordinário, e é o que já está a acontecer neste momento. Mas é preciso sairmos à rua este sábado para tornarmos este momento ainda mais extraordinário, precisamos de cavar uma trincheira bem funda em volta deste Governo e de todos os troikistas que o apoiam e que apoiam a Troika. É preciso, neste sábado, sermos o maior número possível de pessoas na rua, com imaginação, com vontade, com energia, com a mente aberta, para nos conseguirmos juntar em unidade contra a Troika e contra este Governo. Se assim for poderemos acordar no dia seguinte e acreditar que o caminho que muitos começarão no dia 15 de Setembro, e que outros já começaram em todos os protestos anteriores, se vai tornar cada vez mais extraordinário.

MARCO MARQUES

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

A Única Inevitabilidade É a Mudança


A injustiça diária a que os portugueses são sujeitos é apresentada como inevitável, mas os grandes momentos de crise são precisamente os momentos em que um país deve recordar os valores fundamentais da justiça, da solidariedade e da igualdade. O actual governo não compreende isso. É essa a razão pela qual acredito que este governo já não é deste país. Dia 15 de Setembro, sei que muitos portugueses vão sair à rua porque acreditam que a única inevitabilidade é a mudança.

TIAGO RODRIGUES

Rio de Multidāo Lutando com a História na Māo

Ontem à noite, o meu filho, antes de se deitar, veio ter comigo e disse-me, com aquele ar gozão que eu conheço tão bem e que ele usa sem se dar conta para atenuar emoções demasiado intensas: "Mãe, estou muito orgulhoso de ti e dos teus amigos marginais que passam a vida a tentar mudar o país.''
E eu, tantas vezes preguiçosa, tantas vezes displicente, eu que tantas vezes tenho vivido abaixo das mi
nhas capacidades, eu, que tantas vezes tenho deixado a cozinha por limpar e o carro por aspirar, que tenho deixado textospara escrever amanhã, que tenho até chegado a pensar que mais vale arrumar as botas, eu verifico que nesta simples frase está tudo. Tudo.
O orgulho do meu filho. Da minha filha. Tudo o que eu quero. Tudo o que eu preciso. É por eles que saio à rua. Por eles continuo a levantar-me todas as manhās para trabalhar de olhos fechados num emprego que detesto e que nada tem a ver comigo. Por eles adio o meu sonho vezes sem conta. Por eles cometo a incoerência de prosseguir alimentando um sistema que abomino e que nos está a destruir, a mim, a eles e a ti que me lês, talvez.
Mas ele tem orgulho em mim, muito, foi o que ele disse. E eu orgulho-me que ele se orgulhe de mim. Que mais pode querer uma māe?
Que mais pode querer? Pode querer muito. Pode querer tudo. Menos que isso é desistir do mundo. É desistir da vida. E eu nāo desisto. Há quem queira, quem tudo faça para que eu desisto, mas nāo, eu nāo. Os meus filhos merecem o mundo que eu sonhei. Eu mereço o mundo que sonhei. O que me foi prometido. Eles merecem crescer acreditando que vāo ser felizes, como eu cresci. Acreditando que vāo realizar os seus sonhos, como eu cresci. E para isso bater-me-ei todos os dias da minha vida.
Os meus amigos. O Luis que está na prateleira. O Joāo que foi despedido. O Miguel que queria ser actor e que todos os dias afoga a frustraçāo num mar de cerveja.
As minhas amigas. A Sara que está desempregada. A Rita que se mata a trabalhar. A Inês que queria montar um pequeno negócio. A Mariana que está doente e nāo pode parar para se tratar porque se o fizer nāo terá como dar de comer à filha.
Tanto talento, tanta energia desperdiçados. Tanta gente a viver abaixo, abaixo das suas expectativas, abaixo das suas necessidades, abaixo das promessas com que crescemos. Abaixo.
Marginais. É verdade. Somos marginais. Nāo queremos trabalhar. Nāo queremos trabalhar sem os direitos pelos quais morreram os nossos antepassados. Nāo queremos trabalhar até cairmos de exaustāo. Nāo queremos trabalhar até morrermos de velhos sem termos vivido. Nāo queremos trabalhar em ambientes podres, doentes, doentios, que nos cortam as asas, a criatividade, a motivaçāo. Nāo queremos trabalhar a troco de salários miseráveis, nem a troco de talões de supermercado. Nāo queremos trabalhar 60 horas por semana. Nāo queremos trabalhar para criar a riqueza com que os patrões se banqueteiam à nossa conta enquanto nós contamos os cêntimos. Nāo queremos só comida, queremos comida, diversāo e arte, queremos a imaginaçāo ao poder, queremos o descrescimento. Sim, somos marginais. Somos marginais porque pensamos à margem. Somos marginais porque somos mantidos à margem. Marginais porque as margens nos comprimem. Marginais mas nāo violentos. Apenas queremos mudar o país, disse ele. Mudar o mundo. Mudar.
Mudar. Mudar-nos. Mudar para dentro, mudar para fora. Mudar para melhor, porque para pior já basta assim. Mudar porque é possível. Porque é preciso. Porque é urgente. Porque é devido. Sábado saio à rua. Sábado começo a mudar o país. Sábado começo a mudar o mundo. Sábado reclamo a minha vida. A dos meus filhos. A dos meus pais. A dos meus amigos. A tua. Sábado deixo de ser marginal, deixo de ser margem, torno-me rio. Rio de multidāo lutando com a história na māo. Sábado quero encontrar-te. Vens?

MYRIAM ZALUAR

Não Quero Deixar aos Meus Filhos um País de Novos-ricos que Dão Trabalho a Novos Escravos

Herdei um país feito de suor, de alma, de luta, de sangue, um país que me foi deixado pelo meu pai. Pelos pais de nós todos.
Sou, hoje, pai. Não posso deixar um país pior aos meus filhos. Não posso nem quero, pelo amor que sinto por eles, pelo futuro que merecem ter, também por respeito à geração anterior.
Não quero deixar aos meus filhos um país de novos-ricos que dão trabalho a novos escravos.
Escravos calados, escravos medrosos, escravos que temem, que falam baixo, que olham para o chão. Um país do respeito medo, do calado medo, do medo identidade. Do medo. Um país da caridade, e não da resposta solidária. Um país em que as pessoas estendem a mão, e não onde as pessoas agarram o que é seu por direito, um direito conquistado como seres humanos que todos os dias se levantam para uma vida de luta e de trabalho.
O nosso País não pode mais ser visto lá fora com o desdém que se olha com os que se satisfazem e docilizam com o elogio fácil, o elogio que nos faz ficar em casa pois é o que os bem comportados fazem. Não foi por isso que fomos conhecidos antes, não é por isso que seremos conhecidos agora!
Temos um governo que nos está a desafiar para sair à rua. Um desafio para mostrarmos a massa de que somos feitos. Este governo desafia-nos, olhos nos olhos. Desafia-nos nas palavras e nos actos! Não podemos mais olhar para o lado. Está na hora de, também nós, os olharmos nos olhos. Olhar nos olhos um governo que se esconde atrás da troika. Um governo que se esconde atrás da culpa de outros, a liturgia gasta da pesada herança, nunca a culpa é deles. Um governo que falha, erra, mente, mas que nos quer convencer que sempre disse a verdade e nada mais do que a verdade.
Um Primeiro-ministro que às 7:20 da tarde “sofre” enquanto fala ao país, mas que às 8 já canta, não me merece respeito.
Abriram a porta do nosso país a uma quadrilha de agiotas que nos veio saquear e pilhar, não vieram ajudar.
O mais perigoso ladrão é o que entra em nossa casa pela porta de frente, convidado, como se fosse nosso amigo. Um amigo não cobra 34,4 mil milhões por um empréstimo de 78 mil milhões!! A agiotagem travestida de solidariedade. E é suposto agradecermos!
Pelo menos permitam-nos que chamemos os bois pelos nomes! E é isso que faremos no próximo dia 15 de Setembro. Recuperar a nossa dignidade, o nosso orgulho, as nossas vidas que estão sob sequestro, por parte desta gente sinistra que entrou em nossa casa, convidada por gente ainda mais sinistra.
Mudança? Talvez começar por eleger Portugueses que governem a pensar no bem estar de nós todos, e não governem no intereresse da oligarquia arrogante, parasita, mais ou menos oculta, que nos governa desde sempre. Seria, finalmente, um bom começo. Esse será o amanhã pelo qual todos teremos que lutar!
Não é hora de ficar em casa. Espero ter muita gente na rua no próximo dia 15. Mas mesmo que sejamos poucos, vamos insistir, insistir, insistir até ao dia em que seremos muitos, o dia em que eles não vão conseguir deixar de nos ver!
Olhei para o lado, e vi gente com alma, gente ao lado da qual me orgulho de caminhar. Junta-te a nós!

RICARDO MORTE

CHULLAGE: Que se Lixe a Troika

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Percurso / Troikistas / Tachos e buzinas

No próximo sábado seremos muitos milhares nas ruas e praças de todo o país. Acordámos e não mais os deixaremos descansar.

Percurso | A manifestação do em Lisboa partirá da Praça José Fontana, descendo a Avenida da República e passando pela representação permanente da troika, a meio da avenida. Seguiremos pela Avenida de Berna, terminando na Praça de Espanha. Esta praça, além do seu tamanho que permitirá receber em segurança as muitas pessoas esperadas, é onde se encontra a reisdência oficial do embaixador de Espanha, país em que, no mesmo dia, milhares se juntarão também nas principais cidades para contestar as medidas de austeridade e a troika, constituindo portanto esta data um protesto ibérico contra a troika, um protesto inédito quer pelas suas dimensões quer pelas suas características, e que tudo leva a crer será um ponto de viragem na nossa História recente.
Que se lixem os troikistas | A troika, sendo o principal motor de todas as medidas de austeridade, não está sozinha e utiliza os governos como o de Passos Coelho, Vítor Gaspar e Miguel Relvas para impor a nível nacional as medidas de destruição das nossas vidas. Estabelecemos uma linha. Que se lixe a troika mas que se lixem os troikistas também. Que se lixe a troika e qualquer governo que queira governar com a troika e a austeridade. Passos e Gaspar, mais troikistas que a troika, são fantoches bem-mandados que executam as ordens vindas do FMI, BCE e Comissão Europeia. Não servem.
Tachos e buzinas | Pedimos a todas e todos os participantes que no dia 15 tragam tachos e colheres de pau para a manifestação, para realizarmos a maior caçarolada da história do país e que a nossa indignação e a nossa força ecoem bem alto nas ruas do país. A quem não possa participar na manifestação apelamos a um buzinão nacional a partir das 17h, contra a troika, contra os troikistas e pelas recuperação das nossas vidas.
Dividiram-nos para nos oprimir. Juntamo-nos para nos libertarmos. Está na hora de algo extraordinário.

QUE SE LIXE A TROIKA! QUE SE LIXEM OS TROIKISTAS!
QUEREMOS AS NOSSAS VIDAS!

Extraordinariamente Convicta: Que se lixe a Troika , Queremos as nossas Vidas.

Há 2, 3 anos seria para mim quase impensável ser uma das pessoas que apela a uma manifestação com o lema “que se lixe a troika”, que fala em “saque”, “lei da selva” ou cujo texto de apelo termina com “Dividiram-nos para nos oprimir. Juntemo-nos para nos libertarmos”. Participaria, mas apelar e dar a cara por uma manife
stação com essa “retórica”? Muito dificilmente. Porque acharia que era um discurso demasiado forte, exagerado, contraproducente, talvez até demagógico. Hoje, não só não acho, como o acho fundamental, pura e simplesmente porque ele corresponde à verdade e a uma necessidade. Tudo o que fui lendo e questionando, aprendendo, partilhando, observando, vivendo mostra-me que ele é cruelmente certeiro e que deve, por isso mesmo, ser dito, sem meias tintas nem hesitações. Esta “crise” que estamos a viver não é mais do que parte integrante de um sistema que brinca com as nossas vidas, as vidas da grande maior parte de nós, e que pretende continuar a fazê-lo sem qualquer pudor ou vergonha. Se nós deixarmos.
Vim para Portugal há 11 anos. Não estava nada nos meus planos ficar por terras lusas mas acabei por ficar. Lembro-me de ter entrado para a Universidade de Coimbra em 2001 e de, na altura, ter ficado particularmente perplexa com o facto de o valor das propinas ser mais elevado do que aquele que pagava em França, país em que a média dos salários já era mais de duas vezes superiores aos portugueses. Propinas, custos relacionados com o acesso e a frequência do ensino superior para os quais os apoios sociais existentes ficavam, já então, muito abaixo dos existentes no país onde eu tinha nascido e vivido. Hoje, essa desigualdade agravou-se. E esta é apenas uma de entre muitas. Recorrentemente, pessoas da minha família e pessoas amigas residentes em França questionavam a minha decisão de optar por viver em Portugal, país diziam (e bem pois..) com “salários tão baixos”, com “poucas oportunidades no mercado de trabalho”, com um “baixo nível de vida”, com, com, com. Estranho. Ao que parece, pelo que nos andam constantemente a apregoar, essas realidades eram e são compatíveis com o termos “vivido acima das nossas (poucas) possibilidades”. Alguns viveram pois, mas não são com certeza a grande maioria daqueles e daquelas que estão a pagar, e muito caro, por uma crise que não criaram. Estranho. Agora é o Governo que me manda emigrar de novo.
Estranho. Se continuar a querer viver aqui é suposto, enquanto jovem, aceitar e achar natural, “inevitável”, que o meu presente e o meu futuro oscilem entre o desemprego, o sub emprego, a precariedade, os baixos salários, a desprotecção laboral e social, o não conseguir poupar o que quer que seja e ter de recorrer, ad eternum, ao meu pai e à minha mãe quando aparece uma factura maior ou uma despesa inesperada. Se continuar a querer viver aqui é suposto achar natural e “inevitável” um/a jovem ter de adiar constantemente o seu projecto de constituir família, adquirir a sua autonomia, resignar-se a trabalhar a qualquer custo e em qualquer lugar porque, já se sabe, “é melhor isso do que nada”.
Estranho. Enquanto mulher é suposto aceitar, achar natural e “inevitável” que me despeçam, me recusem um emprego ou o acesso a determinado posto por ser… mulher, poder vir a engravidar, ousar pensar em ter crianças ou ser mãe. É suposto aceitar, achar natural e “inevitável” ter, por ser mulher, muito mais probabilidades de aceder a um emprego precário, de trabalhar na economia informal, ou de receber um salário inferior ao que auferiria se fosse um homem. É suposto também tolerar que uma mulher que seja vítima de violência doméstica, e são muitas, não consiga sair de uma relação violenta por não ter autonomia económica, autonomia profundamente prejudicada pelas várias e consecutivas medidas de austeridade que foram e são tomadas. É suposto aceitar, achar natural e “inevitável” que às mulheres seja pedido para regressar ao lar, para serem mães, educadoras, cuidadoras da casa e que assegurem todos os serviços - a saúde , a educação, a protecção social - nos quais o Estado tem, brutalmente, cortado. E é suposto aceitar e achar natural e “inevitável” que, associado às políticas neoliberais, esteja um discurso profundamente conservador pretendendo novamente tutelar os nossos corpos e a nossa autodeterminação .
Estranho. Enquanto filha de emigrantes que saíram de Portugal e entraram ilegalmente em França para fugir da miséria à procura de oportunidades para as suas vidas, as vidas das suas famílias e as das crianças que queriam ter, é suposto aceitar, achar natural e “inevitável” que quem procure fazer o mesmo em Portugal, legal ou ilegalmente, seja tratado como descartável , pessoa a usar quando e para o que precisamos e que se despreza, se violenta, quando já não dá jeito - como estão aliás neste momento a ser tratados/as vários portugueses e portuguesas que emigraram com o eclodir desta “crise”.
Estranho é ter de tomar tudo isto, e muito mais, como inevitável. À excepção da morte - que muitas pessoas verão de resto antecipada com estas medidas que, como todos os indicadores o comprovam, só nos empobrecem, nos retiram direitos essenciais, nos afundam na recessão, nos empurram para um túnel sem luz à vista - nada é inevitável. É tudo fruto de relações de poder, relações de força, interesses, perspectivas, escolhas.
Enquanto jovem, filha de emigrantes, mulher, feminista, cidadã, pessoa: inevitável é denunciar e recusar o que nos apresentam como inevitável. A nós e ao povo grego, espanhol e à maioria das pessoas por esse mundo fora. “Inevitavelmente” tenho o dever de mandar lixar isso tudo e de querer e de exigir a minha , as nossas vidas.

MAGDA ALVES

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Destroika - MITOS E DESMITOS DA TROIKA Mito #2: Temos de Cumprir nos nossos Compromissos

É Preciso Gritar. No dia 15 de Setembro, quem Ficar Calado não Tem Razão

Assistir ao trabalho dos criados do capital é deprimente, mas a falta de esperança é irmã gémea da falta de coragem. As razões para a indignação são demasiadas. É preciso gritar. No dia 15 de setembro, quem ficar calado não tem razão. JOSÉ LUÍS PEIXOTO

Democracia Concessionada

Em entrevista à TVI no passado dia 23 de Agosto, António Borges, conselheiro do governo para as privatizações, afirmou que considerava «muito atraente» a possibilidade de concessionar a RTP1 a investidores privados, cenário que seria acompanhado da extinção da RTP2. As declarações do ex-director do departamento para a Europa do Fundo Monetário Internacional (FMI) e ex-vic
e-presidente do Golman Sachs International tiverem o condão de trazer para o debate público e mediático questões que há muito deviam suscitar a atenção dos cidadãos.
Essas questões não se prendem apenas com o serviço público de rádio e televisão – ainda que a sua defesa seja urgente e exija um empenhamento de cidadania, que seja crítico e capaz de escrutinar a qualidade e a boa administração de um serviço que tem de assegurar o direito constitucional à informação. Com efeito, as declarações de António Borges, o mesmo que já nos disse que o desemprego é uma grande oportunidade e que é urgente baixar ainda mais os salários, vieram mostrar um quadro ideológico e de funcionamento que tem vindo a nortear a destruição de todos os serviços públicos. E vieram também ilustrar uma transformação que está a ocorrer ao nível da natureza do regime democrático, que parece ter sido, ele próprio, objecto de uma concessão a interesses privados. Em tempos de austeroliberalismo, a democracia converteu-se numa democracia concessionada.
Este será, sem dúvida, um regime «muito atraente». Mas não para a maioria da população. Com o desmantelamento dos serviços públicos, e seja qual for o regime jurídico que é encontrado para cada caso (privatização, concessão, parceria público-privado, etc.), o que está a acontecer é uma transferência sem precedentes de recursos públicos para um capitalismo de rentistas e especuladores financeiros que operam à escala nacional e global. E é também um desapossamento dos instrumentos imprescindíveis para servir a população e garantir o direito aos vários bens públicos (informação, água, saúde, educação, habitação, segurança social, etc.).
Esta transferência ocorre ao mesmo tempo que está a ser imposto ao mundo do trabalho um aumento brutal da exploração: diminuição de salários e das indemnizações em caso de despedimento, aumento e desregulação do tempo de trabalho, ataque à contratação colectiva e outras conquistas sindicais, crescente precariedade e desemprego, etc. E acontece a par da redução, senão supressão, de formas de protecção social (subsídios, abonos, etc.) sem as quais não pode haver coesão social.
Se conjugarmos todas estas transformações que se verificam na sociedade portuguesa – um dos mais nítidos balões de ensaio do projecto austeroliberal –, não é difícil perceber que, apesar de formalmente vigorar um regime que tem na soberania popular a sede da sua legitimidade, na verdade foram-lhe retirados os instrumentos para poder executar o que deviam ser as suas missões fundamentais. Quais são elas? Em primeiro lugar, combater a exploração, a qual é responsável (com as falhas nos serviços públicos e na fiscalidade progressiva) pela tragédia colectiva que são as desigualdades socioeconómicas. Em segundo lugar, criar, através da redistribuição e de um crescimento sustentável, as condições materiais e subjectivas que permitam a cada cidadão desenvolver-se como um sujeito autónomo, isto é, como um ser livre.
Como foi possível deixarmos que se concessionassem os instrumentos da democracia (administração de recursos, definição de políticas redistributivas, etc.), sem percebermos que o corolário disso seria a perda, no país e fora dele, do poder indispensável para prosseguir as finalidades substantivas da própria democracia? Entre outros factores, pesou certamente o modo como, colonizados pela ideologia do pensamento único e seus aparelhos, descurámos a dimensão conflitual das escolhas que constantemente ocorrem nas sociedades. Desvalorizámos o conhecimento aprofundado – que exige estudo e atenção aos detalhes – e adiámos o posicionamento activo e responsável de cada um de nós sobre as decisões tomadas em nosso nome. Perdemos a dimensão do antagonismo, muitas vezes irreconciliável, que existe entre interesses. Esses interesses contrários continuaram a dar origem a escolhas, mas delas esteve ausente o critério popular.
Herdeiros de gerações que instauraram a democracia, as férias, o salário mínimo ou o direito de todos à assistência médica, perdemos de vista – com a preciosa ajuda dos dispositivos postos em prática para apagar ou rever a memória histórica – o quanto todos estes direitos foram arrancados a poderes que tudo fizeram para se lhes oporem. E perdemos também de vista, no mesmo passo, todos os direitos que já deviam ter sido alargados a mais cidadãos, a contragosto dos poderosos. A fixação de um salário máximo é apenas um exemplo entre muitos.
Enquanto isso, o poder de fazer as escolhas que afectam as nossas vidas foi-se concentrando numa aliança formada entre dois pólos (intensamente porosos…). De um lado, figuras e instituições que são apresentadas aos cidadãos como «técnicas» e «neutrais», mas que as mais das vezes estão ligadas aos interesses dos mercados financeiros, e nem sequer são submetidas ao crivo democrático das eleições e da prestação de contas. Do outro lado, os poderes públicos que executam as políticas que beneficiam aqueles interesses privados, por identificação ideológica e porque dessa forma se transformam nos ricos e poderosos (mesmo que descartáveis) distribuidores de negócios, dinheiro e poder. Fora desta aliança, a maioria da população. Cada vez mais afastados da participação e da negociação democrática, os cidadãos são transformados em objectos, e já não sujeitos, de política.
A democracia concessionada ao «governo dos técnicos» produz uma objectificação e uma realidade social tão grave que atordoa, pelo menos temporariamente. Esse atordoamento assume várias formas, em vários rostos: para uns é difícil acreditar que uma situação tão grave e tão contrária às promessas da democracia possa ser algo mais do que passageira; outros convencem-se de que têm culpa, individual e colectiva, nas desgraças de que são vítimas; outros ainda perdem a esperança por não verem surgir um pólo aglutinador capaz de criar uma aliança alternativa àquela que detém o poder (com propostas políticas e força para as concretizar); muitos outros vivem consumidos pelo medo de não ultrapassar as dificuldades, gastando uma imensa parte de cada dia em estratégias e tarefas de sobrevivência individual.
Não há como negá-lo: recuperar os instrumentos da democracia que permitam uma nova, mais responsável e mais participada reorientação da comunidade para os combates pela igualdade e pela liberdade é algo que vai ser feito em condições extremamente difíceis. Mas os cidadãos não têm alternativa senão fazê-lo. Ou deixarão de ser cidadãos. Porque, em rigor, a democracia concessionada não é uma democracia.

SANDRA MONTEIRO, Jornalista, Directora do Le Monde Diplomatique - edição portuguesa

Saio à Rua porque já não Posso mais

Saio à rua no dia 15 porque estou farto de estar em casa, a ver o telejornal, a indignar-me com as notícias, a ouvir bramar nos cafés, a saber que fulano ficou sem emprego, beltrano deixou de estudar, sicrano foi para os Alpes pastar caracóis, o Manel vendeu o carro, a Maria teve de largar a casa e foi viver com a mãe, o Joaquim passou à mobilidade, o sr.Gil não tem dinheiro para os remédios, a minha filha não foi à praia um dia que fosse neste Verão, e eu para aqui a ver telejornais e a denunciar alarvidades no facebook e a espantar-me com a lata destes tipos, que confundem governo com Estado, pessoas com acções, massa e arroz com fundos de investimento, e ainda me vêm dizer que vivi acima das minhas possibilidades e que temos de salvar os bancos e se calhar a Volkswagen, coitadinho do BPN e da Telefunken, a peninha que eu tenho deles, mais a Lehman Brothers e a puta que os pariu a todos mais ao Dow Jones e ao Psi20.
Saio à rua porque não tenho cara para ficar mais tempo em casa, a assistir à pouca vergonha e ao sacrifício deste povo, mesmo que ele continue a votar neles, mesmo que ele não saia para a rua comigo e ache normal que estes anormais vendam o que afinal é dele - nosso - para pagar dívidas que não são minhas - nossas.
Saio à rua porque já não posso mais. É escusado entrar em mais pormenores. Toda a gente percebe por que saímos à rua. Até eles percebem. Chega!

ANTÓNIO COSTA SANTOS

PRECÁRIOS INFLEXÍVEIS | Que se lixe a troika! Queremos as nossas vidas!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

«Não» é «não»!

Andamos afónicos de tanto gritar «basta!». Os nossos governantes ignoram-nos, fingem não nos ouvir, enquanto trocam sorrisos com os amigalhaços a quem oferecem todas as regalias e privilégios.
Em Portugal e por toda a parte, em poucos meses destruíram direitos que levaram séculos a conquistar e que custaram a tantos homens e mulheres como nós, no mundo inteiro, anos de prisão, tortu
ra, por vezes a própria vida. O direito a uma vida condigna, a um salário justo, o direito a partilhar e usufruir da riqueza gerada pelo nosso trabalho, neste mundo que ajudamos a construir todos os dias, o direito à Saúde, à Educação e à Cultura.
As nossas contribuições através dos descontos para a Segurança Social e do IRS são tratadas como impostos feudais, que pagamos aos grandes senhores donos do mundo pelo atrevimento de existirmos, e não como contributos para a construção de um Estado mais justo. Desprezam e desprestigiam o sistema democrático, esquecendo – ou fingindo esquecer – que são eleitos pelo povo para o representar e para defender os seus direitos na gestão dos bens públicos em proveito de todos; em vez disso vendem o país ao desbarato.
Não! O Estado somos todos nós e os bens do Estado são nossos!
Não estamos à venda, nem aceitamos que nos roubem em nome de uma dívida que não contraímos. Insistem em atribuir nos as culpas, como quem responsabiliza a criança que gastou o troco em rebuçados pela falta de dinheiro para a renda da casa. Fazem tábua rasa das quantias exorbitantes que, ao longo de anos, sacaram ao Estado e ofereceram aos amigos nos grandes grupos financeiros, em recapitalizações, privatizações a pataco e pretensas parcerias público-privadas; nas mesas de jogo dos mercados internacionais, os comparsas especulam sem pudor, arriscando desplicentemente os destinos dos povos.
Não! Não aceitamos agiotas que jogam as nossas vidas a feijões!
Para alimentar a besta, sugam até ao tutano quem trabalha, humilham e condenam a uma dura subsistência reformados que ao fim de tantos anos de trabalho e contribuições merecem gozar a vida e beneficiar da riqueza que ajudaram a acumular, destroem o futuro das novas gerações, condenando-as a um regime de semi-escravatura depois de lhes acenarem com el-dorados de licenciaturas e profissões construtivas na sociedade.
Dividem o mundo entre poderosos na engorda, com todas as regalias e nenhumas obrigações, e sub-humanos a quem sugam as vidas, com todas as obrigações e nenhum direito.
Não! O mundo não tem donos nem elites!
No dia 15 de Setembro, é preciso gritar até que nos oiçam.
«Não» é «não»! Que se lixe a troika! Queremos as nossas vidas!

RITA VELOSO

Porque É Preciso Fazer Alguma Coisa de Extraordinário.

Porque nos roubam a dignidade.
Porque nos falseiam a identidade.
Porque nos desprezam o viver e nos impingem a pobreza e o desespero como medidas inevitáveis, em forma de acordos unilataerais que devemos cumprir sem questão ou protesto.
Porque questionamos.
Porque não somos bonecxs nas mãos frias da ganância, e recusamos ser solução para a imperante sede de lucro.
Porque "a crise" é só para a maioria - a minoria existe, governa e enriquece.
Porque acordar com esperança se torna mais raro a cada dia. A cada pessoa.
Porque nos querem isoladxs, distantes de todxs, ausentes de nós.
Porque nos tiram as casas, os empregos, a verdade.
Porque nos roubam as necessidades básicas para uma vida digna.
Porque acreditamos na igualdade de oportunidades para todxs, independentemente de género, raça ou classe social.
Porque a solidariedade existe em nós, e sem nós é o nada que estes tempos - dizem-nos, mentem-nos - impõem.
Porque nos querem sós.
Porque não estamos sós.
Porque há o meu grito, o teu ombro, as nossas mãos.
Porque juntxs somos força.
Porque juntxs somos mudança.
Porque é preciso fazer alguma coisa de extraordinário.

ANA NICOLAU

Bandex | Que se lixe a troika! Manifestação 15 Setembro.

Destroika - Que se Lixe a Troika | 15 Setembro

domingo, 9 de setembro de 2012

Por Um País de Luz Perfeita e Clara

Estes são tempos de cinza. Estamos imersas e imersos nas cinzas dos incêndios que a troika, esse monstro de homens e gente afundada em fortunas e maldições de Midas, ateia com volúpia. Não. Eu digo-lhes não, não e não. Chega. Basta. Esta é a minha gente, este é o meu povo, estes são os meus rostos de silêncio e de paciência (e não perco tempo a explicar-lhes qu
em é Sophia, porque é nossa e de todos, e para todos a luz, para todas tudo; mas não para quem nos dispara a perdição no rosto), e é por eles que não vos deixarei nunca cantar vitória. digo-lhes. Porque estes rostos também são de bravura e dignidade, grito-lhes. Quinze, Setembro, em todas as ruas, em todos os poros da pele deste país de rochas e sonhos profundos, sibilo-lhes.
Não quero o fim de algo. Quero que tudo comece. Não sei o que é uma revolução, mas sei o que é cantar e sentir a voz espacial, degrau a degrau, porque os nossos ombros estão todos à altura da dignidade que nos faz cantar, à altura do olhar que nos faz mirar um futuro de luz perfeita e clara. Porque sim. Porque podemos. Porque sabemos. E somos todos vozes de fúria. E seremos todos vozes de vitória. Não quero que tudo acabe. Quero que tudo comece, que a realização das nossas potências não seja um sonho demente (como os poderes desejam, desvelados que estão, desnudos na sua podridão); quero que tenhamos direito ao delírio; quero coisas belas e radiantes para estes rostos esculpidos ao vento. A troika deleita-se com computadores e previsões e inevitabilidades. Nós temo-nos umas às outras. Nós agarramo-nos uns aos outros. Deixemo-los falar a língua da técnica e da estatística e dos números. Nós falamos em todas as línguas do mundo. Nós olhamo-nos em todos os olhos do mundo. A troika sabe muito. O governo sabe tudo. Nós também sabemos muito, mas levantamo-nos do chão porque sabemos, acima de tudo, sentir e pensar. Nós somos horizontes de alternativas. E, em bom português - sempre em bom português -, há mais dias que chouriços. Cá estaremos, de riso guardado, de sofrimento ao peito, mas sempre com o futuro em riste, porque a nossa perdição não vo-la daremos nunca.
Não sei onde este quinze de muitos nos pode levar. Sei para onde a troika pode ir. Sei o que quero dizer à troika. Mas prefiro juntar-me às mil vozes que o dirão. E é isto que encostará o meu ombro ao teu.

LUÍS BERNARDO

Sabes como é

o que a gente quer é mudar o mundo, não fazemos a coisa por menos, já os beatles vinham com esta cantiga e a culpa não foi da Yoko Ono. Só que nem por isso os caciques se espantam e os cidadãos se acordam a montar algo de agradável. Parte será questão de gosto e feitio. Será outra de transigir, que é do mais difícil que há quando divergem os nossos absolutos. E depois há o medo, que
facilmente se dilui nesta modernidade líquida, que requer determinação para se dissolver. E por vezes sabes lá de que parte te privas porque eles querem, e que parte outra sonhas porque ainda eles te deixam. Que tramada é esta terceira pessoa plural indicativa––até porque há quem acredite que a coisa é nossa e quem cultiva e partilha o comum deve por ele––e por si–– responsabilizar-se: um qualquer elo que não tem de ser sólido mas convém que funcione em conjunto. Isto é: inventámos a roda e a democracia, o que foi muito; agora é revolver os eixos pares, os dinâmicos êmbolos do teu trabalho, dentro e fora, aros distribuidores de luz. E depois poder também girar suficientes e livres, que é o que hoje nos retiram, porque antes nos querem eficientes e crentes no paradoxo da austeridade produtiva. Mas sabes o resgate: a tua natureza contra o abstracto que estabelecem os banqueiros, vertigem de fumo e espelhos, de mal formados fabricantes de armas e andróides. Que o consumo que te vendem só te rouba o desejo e estraga o clima, imateriais super-potentes de viagras, os vilõezinhos das troikas, que te dizem que lhes deves quando tu nunca os viste mais pobres, a empatar o que tens a fazer––ah! o amor. E há por ora esta divisão: eles ou tu. E é relativamente simples: eles são poucos, querem mandar; tu és dos tantos que queremos mudar.
Já calhava bem uma revolução.

MARGARIDA VALE GATO, tradutora, professora universitária, poeta.

sábado, 8 de setembro de 2012

Não os Podemos Deixar Descansados

Nos últimos anos, por motivos profissionais, tenho viajado para diferentes cidades do hemisfério norte. Umas vezes só, outras com a família, chega sempre a pergunta: seríamos capazes de viver aqui? Como a maioria dos que habitam este país, o nosso futuro pode não passar por fazer a nossa vida em Portugal. Neste momento, só a nossa vontade nos faz ficar.
Há dez anos trabalhava fora do país. Tinha
um contrato, recebia um salário superior ao que alguma vez tive em Portugal e as perspetivas que tinha permitem-me afirmar que, se não tivesse escolhido regressar, hoje viajaria por todo o mundo e auferiria um salário, no mínimo, dez vezes superior ao que tenho actualmente. Mas escolhi regressar.
A crise já cá estava e servia de pretexto para baixar salários, retirar direitos e generalizar o recibo verde. Para ter mão no nosso futuro montámos um negócio, fomos ganhando trabalho. Diziam-nos que éramos a classe média - essa mistificação que o capitalismo inventou para apaziguar a luta de classes e para esconder a divisão entre exploradores e explorados -, até, patrões.
Em Portugal ou na Grécia - países com os quais o capitalismo alimenta o seu processo de acumulação - em poucos meses, a classe média praticamente desapareceu. Uns foram perdendo o emprego. A maioria o salário. Todos a esperança. A quem nunca foi permitida a passagem a “classe média” foram-lhe sendo retiradas liberdades, foram sendo criadas novas dependências sob a forma de “trabalho voluntário” ou “apresentações” perante o Estado. A alguns, permitem-lhes comer os restos.
Mas se há uma coisa sobre a qual não restam quaisquer dúvidas neste processo de acumulação é que há apenas 1% que decide sobre o futuro de todos e que, de um dia para o outro, podemos ficar sem o dinheiro que temos depositado no banco, podemos ter de tirar os nossos filhos da escola, podemos não encontrar um médico no hospital ou o que comer no frigorífico.
Haverá alternativa no quadro da União Europeia ou do Euro? Ninguém pode ter a certeza. Haverá alternativa no quadro do sistema capitalista? Creio que não.
A certeza que podemos ter é que fizemos mal em deixar o Estado nas mãos de quem o quer privatizar, tal como fizemos mal em deixar o Estado nas mãos de quem dele se quer aproveitar. Fizemos mal em deixar PS/PSD/CDS alambazarem-se de submarinos a robalos, contraindo uma dívida que agora nos dizem pertencer, administrando o seu pagamento a um grupo de agiotas. A certeza que posso ter é que não os podemos deixar governar descansados e que importa unir esforços para fazer frente às suas medidas.
A certeza que posso ter é que se nada fizermos vamos ter de procurar a esperança, um a um, noutras paragens.

TIAGO MOTA SARAIVA

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Flashmob Que se Lixe a Troika

Porque Odeio a Troika? (e que se Lixe a Troika e não as nossas Vidas!)

 Não há dúvida que a TROIKA , a crise e a estagnação da economia também afetam bruscamente a vida das pessoas imigrantes, provocando o aumento das perseguições , xenofobia, racismo e desigualdade .
A TROIKA , espreme e escraviza, incita a culpa, que também é chamada de imigração! Migrante, imigrante, gente que logo torna-se r
esponsável pela escassez dos empregos e criminalidade, gente que muitas vezes está silenciada pelo medo e frágil estatuto de cidadania. E como se não fosse suficiente, Portugal também é forçado a sair da rota da imigração e do crescimento económico, todos e todas são chamados a sair, por isso, pode até parecer um sonho, mas todas/os nós estamos no mesmo barco e todos nós queremos nas nossas vidas, saúde, respeito e dignidade.
Por isso que no dia 15 de Setembro, uno-me a vocês pelo fim da TROIKA, antes de tudo!
Beijos e abraços, com enfrentar e resistir.

MAGDALA GUSMÃO

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Faço, logo Existo

Nunca acreditei no Fim da História. Nunca acreditei que existe um estádio terreno cuja meta, sendo alcançada, nos dispensa de pousar o livro e a caneta e viver o resto dos nossos dias de acordo com uma consciência amorfa e submissa. Tão pouco posso acreditar que me digam que para um determinado problema, existe uma solução. Uma solução? Ia julgar que existiam várias, no mesmo nú
mero de visões que encerra a experiência humana. Este é o ponto de partida que me leva à manifestação no dia 15 de Setembro: acredito que as minhas acções determinam a minha existência e o rumo dos acontecimentos. As minhas e as dos/as outros/as.
Não acredito, portanto, na inevitabilidade da Troika, assim como não acredito na marcha inexorável do neoliberalismo económico. Acredito sim que é impossível ficar sentado no sofá quando nos querem diminuir em direitos conquanto nos exigem todos os deveres e mais alguns. Acredito ainda que não podemos tentar sobreviver sozinhos/as e atomizados/as do mundo quando a realidade é dura de mais para ser negada. A nossa consciência, principalmente em sociedade, também necessita de outras para exprimir a nossa identidade. Talvez não partilhemos as mesmas relações com a sociedade, mas a verdade é só uma: somos oprimidos/as, o que varia é apenas o contexto em que essa opressão é exercida.
São oprimidos/as todos/as os/as jovens que estão a ser alvo de uma política elitista que quer mercantantilizar todo o ensino, retirar apoios sociais e condenar toda uma geração a seguir forçosamente para um mercado de trabalho onde a precariedade e a mão-de-obra barata fazem parte da estratégia da Troika para Portugal competir economicamente no contexto externo.
São oprimidos/as todos/as os/as imigrantes, vítimas de intrumentalização através da sua marginalização e clandestinidade para que possam ser explorados sem que possam reivindicar os seus direitos. Para não falar que os seus contributos para a sociedade têm como recompensa a desigualdade de direitos como o acesso à documentação, a certas prestações sociais como o RSI ou a omissão do direito de voto nas legislativas. Nenhum humano é ilegal e todos somos cidadãos íntegros desde que gozemos desse título com todo o esplendor.
Somos todos/as oprimidos/as porque pelo menos conhecemos um/a desempregado/a, um/a trabalhador/a precário/a, um/a professor/a despedido/a ou alguém atingido pelos cortes na saúde, educação, ou qualquer outra área.
A solução? Esta passa pelo aumento do rating da vida de todas as pessoas que não merecem ser um joguete nas mãos dos mercados, passa por reduzir o défice de participação cívica, proceder a reformas estruturais de mentalidade e, por fim, saldar a dívida para com as futuras gerações que têm o direito a sonhar com uma outra sociedade. Não existe fim da História e os próximos capítulos serão escritos por aqueles e aquelas que não se renderam à rotina e assumiram a sua existência e tiveram a coragem de fazer algo extraordinário.

FREDERICO ALEIXO - Licenciado e Desempregado (um dos 15%). Membro da SOS Racismo

Que se Lixe a Troika! Quero a minha Vida!

A manifestação de 15 de Setembro não é a primeira manifestação a que vou. Não será a última. Mas faz pouco tempo desde que comecei a ir a manifestações. Até há poucos anos atrás não participava em muitos protestos, mas o mundo acelerou muito desde então. Mudou. E o que nós aceitávamos como um mundo com muitas injustiças mas ainda assim relativamente digno já é uma miragem que começa a desvanecer-se. Nos últimos anos tudo mudou e as nossas vidas deixaram de contar para o que quer que seja. Para a economia, para os nossos governantes eleitos. E nós deixámos, enquanto povo, que assim fosse. Deixámos, individualmente, que assim fosse. Dividiram-nos e individualizaram-nos para que só olhássemos para nós mesmos, para os nossos mundos pequenos e isolados, débeis. Aceitámos baixar a cabeça quando nos impuseram cortar-nos os salários, comer e calar quando anunciaram o encerramento de maternidades e hospitais, resignar-nos quando anunciaram o fecho de escolas e o despedimento de professores, virar a cara para não ver quando destruiram os direitos no trabalho e impuseram a precariedade para toda a gente. Tardámos a reagir, tão forte era a avalanche de medidas, dia após dia, cada semana ficávamos boquiabertos com a desfaçatez com que se destruía por decreto tudo aquilo que demorou tanto tempo a construir. Tentámos, uma e outra vez, que se percebesse o que estava a acontecer. Que toda a gente percebesse. Mas a repetição constante de que era inevitável, de que tínhamos vivido acima das nossas possibilidades, de que não havia dinheiro, fez muita gente acreditar que era mesmo verdade. Era só ligar a televisão, ouvir o rádio, ler num jornal: "A culpa é vossa!". E nós comemos esta versão, herdámos pelos ouvidos e pelos olhos a culpa da crise. Ouvi pobres, que toda a vida viveram no desenrascanço e na penúria, dizer que tinham vivido acima das suas possibilidades. Ouvi de pessoas que nunca tiveram dinheiro de sobra ao fim do mês dizer que tinham gastado demais, que não deviam ter enviado os seus filhos para a escola, que tinha sido um luxo. Ouvi o homem mais rico do país dizer que não era rico e ouvi o segundo homem mais rico do país dizer que os seus próprios trabalhadores eram uns preguiçosos e que a sua fortuna, a tinha feito ele sozinho. Ouvi um governante eleito dizer que tínhamos todos de empobrecer e que quem tinha juventude e capacidades, deveria partir, ir embora. Herdámos o espírito da derrota, da submissão e do individualismo, com que nos querem domesticar e voltar a tornar um povo pobre, burro e miserável, arrastando-se nas sobras das fortunas das 5 ou 10 famílias ricas do país. Mas há uma coisa importante a saber acerca das heranças: não temos de aceitá-las. E por isso vi também milhares de pessoas mobilizar-se, vezes sem conta, tentanto novos modelos, novas organizações, novas articulações. Por vezes funcionou, outras não. Mas tentou-se, uma e outra vez, e enquanto houver vida e gente digna que fique em pé e que resista, a herança pode ser rechaçada.
Sou activista há poucos mas intensos anos na área da precariedade, e também tenho trabalhado na questão da dívida pública. São dois assuntos da maior relevância nos dias de hoje, e intimamente ligados com tudo o que se vem passando na degradação das nossas vidas, no desemprego à nossa volta, dos trabalhos presos por cordéis que encurralam as pessoas e lhes retiram a confiança e a dignidade, na justificação para impôr medidas de austeridade embora não se saiba o que estamos a pagar, apenas que é preciso pagá-lo. E os barões da moralidade vêm falar-nos do seu trono da nossa necessidade de aceitar em paz e tranquilidade que tenhamos que pagar o que eles se recusam a divulgar, e pagá-lo com juros através da destruição da nossa sociedade.
A nossa sociedade, como as outras sociedades do sul da Europa, têm muitos problemas, e muitos problemas comuns também. Mas hoje temos todos não um espinho no pé, mas uma pistola na boca, e ela chama-se troika. Meteram-na na nossa boca para - dizem - salvar-nos. Mas tudo o que aconteceu desde que ela veio foi piorar o que já estava mal. Diziam que não havia dinheiro - agora há muito menos. Diziam que não havia crescimento - agora há recessão. Diziam que não havia emprego - estaremos cada vez mais perto de dobrar o número de pessoas que não têm emprego. Diziam que a precariedade era um grave problema - e por isso decidiram torná-la regra. Diziam que tínhamos de cumprir os nossos compromissos - e por isso rasgaram um dos nossos compromissos mais antigos e mais consensuais, a Constituição da República e todas as leis que foi preciso ignorar para aprovar as medidas impostas pela troika. Diziam que era preciso pagar o que devíamos - e por isso foram pedir mais dinheiro emprestado, com mais juros, e foram buscar o dinheiro de quem trabalha todos os dias e de quem descontou a vida toda para poder ter uma velhice tranquila. Faz-nos ter que perguntar qual era verdadeiramente o objectivo da intervenção da troika, se tudo aquilo que era previsto tratar, piorou? O objectivo da troika era um e um só - impôr um novo regime - o regime da austeridade. Hoje temos um novo inimigo, comum e absoluto: chama-se austeridade, e o seu representante máximo é a troika. O governo português, como os seus congéneres mediterrânicos, apenas tem a força política para impôr a austeridade por ter a troika nas costas, a puxar cordéis e a dar direcções de fora. Temos um novo inimigo e é um inimigo comum e absoluto. É um inimigo para todas as lutas que se travam neste momento. É um inimigo para quem defende os direitos dos imigrantes, para quem luta contra a pobreza, contra a precariedade e o desemprego, contra o racismo, contra a destruição do SNS, para quem luta pela cultura, pela protecção do ambiente, pela liberdade de informação, pela justiça, pela liberdade, pela democracia e pela dignidade na sociedade. Todas as lutas são importantes. Todas têm de ser travadas. Encontramos na troika uma raíz para todos estes males. Não é a única mas é, neste momento, a mais importante. É tempo de enfrentá-la abertamente. Colectivamente. Façamos de dia 15 um dia em que novamente voltemos a enfrentar e a desafiar não só a troika e o governo como a nós mesmos e o nosso isolamento. Chega de silêncio. Já não se pode! Está na hora de virar o bico ao prego.
Não escolhemos o tempo em que vivemos. Só nos é dado a escolher o que fazer com esse tempo que temos. Queimemos as heranças de individualismo que leva à resignação, submissão e derrota. Reergamos o legado de desafio, de disputa, de solidariedade e de força para mais uma vez nos levantarmos, recusando ser guiados mansamente para o precipício.
Organizemo-nos para a dura luta que temos pela frente. Façamos algo de extraordinário.
Dividiram-nos para nos oprimir. Juntemo-nos para nos libertarmos.

JOÃO CAMARGO,  Engº do Ambiente, Associação de Combate à Precariedade - Precários Inflexíveis, Auditoria Cidadã à Dívida