Nos últimos anos, por motivos profissionais, tenho viajado para diferentes cidades do hemisfério norte. Umas vezes só, outras com a família, chega sempre a pergunta: seríamos capazes de viver aqui? Como a maioria dos que habitam este país, o nosso futuro pode não passar por fazer a nossa vida em Portugal. Neste momento, só a nossa vontade nos faz ficar.
Há dez anos trabalhava fora do país. Tinha
um contrato, recebia um salário superior ao que alguma vez tive em Portugal e as perspetivas que tinha permitem-me afirmar que, se não tivesse escolhido regressar, hoje viajaria por todo o mundo e auferiria um salário, no mínimo, dez vezes superior ao que tenho actualmente. Mas escolhi regressar.
A crise já cá estava e servia de pretexto para baixar salários, retirar direitos e generalizar o recibo verde. Para ter mão no nosso futuro montámos um negócio, fomos ganhando trabalho. Diziam-nos que éramos a classe média - essa mistificação que o capitalismo inventou para apaziguar a luta de classes e para esconder a divisão entre exploradores e explorados -, até, patrões.
Em Portugal ou na Grécia - países com os quais o capitalismo alimenta o seu processo de acumulação - em poucos meses, a classe média praticamente desapareceu. Uns foram perdendo o emprego. A maioria o salário. Todos a esperança. A quem nunca foi permitida a passagem a “classe média” foram-lhe sendo retiradas liberdades, foram sendo criadas novas dependências sob a forma de “trabalho voluntário” ou “apresentações” perante o Estado. A alguns, permitem-lhes comer os restos.
Mas se há uma coisa sobre a qual não restam quaisquer dúvidas neste processo de acumulação é que há apenas 1% que decide sobre o futuro de todos e que, de um dia para o outro, podemos ficar sem o dinheiro que temos depositado no banco, podemos ter de tirar os nossos filhos da escola, podemos não encontrar um médico no hospital ou o que comer no frigorífico.
Haverá alternativa no quadro da União Europeia ou do Euro? Ninguém pode ter a certeza. Haverá alternativa no quadro do sistema capitalista? Creio que não.
A certeza que podemos ter é que fizemos mal em deixar o Estado nas mãos de quem o quer privatizar, tal como fizemos mal em deixar o Estado nas mãos de quem dele se quer aproveitar. Fizemos mal em deixar PS/PSD/CDS alambazarem-se de submarinos a robalos, contraindo uma dívida que agora nos dizem pertencer, administrando o seu pagamento a um grupo de agiotas. A certeza que posso ter é que não os podemos deixar governar descansados e que importa unir esforços para fazer frente às suas medidas.
A certeza que posso ter é que se nada fizermos vamos ter de procurar a esperança, um a um, noutras paragens.
TIAGO MOTA SARAIVA