terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Texto de Jorge Falcato Simões

Eu vou. Como fui ao 1º de Maio de 1974 e, dois dias depois, à ocupação do Bairro da Fundação Salazar (agora bairro 2 de Maio, lá para os lados da Ajuda). Dias intensos. Dias em que sonhei (sonhámos) um Portugal diferente do pais cinzento que nos tinha acompanhado até uma semana antes e que, cada vez mais, sentimos que regressa com pezinhos de lã.

Dia 2 vou manifestar-me pelas saudades que tenho do futuro. Do futuro que começou em 74 e que foi rapidamente atraiçoado. Vou manifestar-me neste presente em que esta traição à esperança dos que estiveram naquele 1º de Maio, e dos que saíram dos bairros de lata e abriram as janelas daqueles prédios na Ajuda gritando que já tinham casa se tornou tão evidente. Vou e espero encontrar, no dia 2, todos os que sonharam outra vida, outro país e que estão dispostos a combater este pesadelo demitindo, na rua, este governo.

Mas também vou por muitos que não podem ir. Por aqueles a quem é costume chamar de cidadãos invisíveis. As pessoas com deficiência, para quem não foram necessários estes tempos de crise para verem negados os mais básicos direitos de cidadania. São os que não podem manifestar-se, porque estão condenados - sem terem cometido nenhum crime - à prisão domiciliária ou a viver em instituições donde não conseguem sair. São aqueles que sobrevivem com 200 euros por mês da Pensão Social de Invalidez - esta designação salazarenta diz tudo - que nem para se deslocarem para tratamentos têm dinheiro. São os jovens que não têm direito a ter uma vida autónoma, sujeitos a uma dependência familiar por ausência de apoios do Estado, ou internados em "lares" de idosos por falta de alternativa.

Vou por todos eles e espero ter comigo mais gente com deficiência porque é altura desta invisibilidade acabar. É altura de sair à rua e dizer que existimos e que não somos cidadãos de 2ª. É altura de dizer que a crise não é desculpa para manter a exclusão a que estamos sujeitos porque direitos humanos não são regalias.


É pelo direito de todos os portugueses a uma vida digna que vou sair à rua dia 2.