sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Texto de Paula Nunes


ENCONTRAMO-NOS NA RUA!

É na qualidade de cidadã preocupada e indignada, sem partido nem sindicato, que subscrevo o manifesto e apelo à união para a convocatória de 2 de Março.

Entretanto, falemos de factos. Mais de 2,5 milhões de portugueses estão a viver em risco de pobreza ou exclusão social, entre os quais as crianças, mais de 418 mil, são as que correm maiores riscos; a privação material severa atinge cerca de 900 mil portugueses, sendo cada vez mais visível o aumento do distanciamento entre a população com mais e menos recursos; mais de 35 mil portugueses usufruem de um Rendimento Social de Inserção que poderá baixar de 189,50 € para 176,15 €; no final do ano transacto foram assinalados 870 mil desempregados e as previsões nada animadoras apontam para uma taxa de desemprego de 16,7 % em 2013 e 17 % em 2014, contrariando como sempre qualquer previsão desta ludibriosa desgovernação.

As medidas anunciadas são uma cilada miserável que conduzirá a um enorme retrocesso nas condições de vida da maioria dos portugueses. São medidas violentas, que atentam contra a dignidade de quem vive ou viveu do seu trabalho. E os profetas das folhas de cálculo, que só se interessam pelo regresso aos mercados financeiros, dizem que estamos no bom caminho. É por este caminho que queremos seguir? De mãos dadas, como se nada fosse, com milhares de desempregados, com a precariedade, com reformados a quem são extorquidos os seus diminutos rendimentos, com crianças esfomeadas, com a miséria que diariamente atira para a rua centenas de pessoas, com a morte das funções sociais consignadas na constituição?

Caminhamos sim, e a um ritmo alucinante, para o empobrecimento colectivo, retrocedendo décadas em todos os índices de desenvolvimento social. Dizem que é legítimo o roubo dos direitos conquistados e o desprezo pela constituição, sempre justificado pelos tempos difíceis em que vivemos. E a nossa liberdade, mais condicionada e desvalorizada, é tratada como uma regalia, um luxo acima das nossas possibilidades e da qual temos que nos livrar.

Não bastando, e para todos os problemas causados por este povo que viveu acima das suas possibilidades, a quadrilha oferece-nos dois bálsamos milagrosos: a emigração e o empreendedorismo. De facto, responsabiliza-nos pela criação de emprego ou pelo desemprego que enfrentamos, como se vivêssemos num país repleto de oportunidades. É difícil, diria eu, pensar em empreendedorismo quando moramos na rua ou chegamos a meio do mês sem dinheiro para comer: 4,488 milhões de portugueses auferem menos de 420 euros mensais.

E para os que acreditam que este caminho será frutuoso, convém estar atento às projecções do Banco de Portugal que, ao contrário das previsões dos economistas de serviço, revê em baixa o crescimento económico para 2013. Por enquanto não sabemos o que irá acontecer em 2014, mas já nos avisaram que é necessário arrecadar 4 mil milhões de euros e delinear medidas suplementares para cumprir objectivos orçamentais. Mas uma coisa sabemos. Nós continuamos a cair!

Não nos deixemos enganar com discursos agradáveis que não têm mais nenhuma finalidade que adormecer consciências e imprimir mentiras em prol da estabilidade política, como um valor que está acima de tudo e de todos.

A gravidade do momento exige um enorme sentido de responsabilidade e o processo não pode ser de transição, mas de ruptura com um modelo e uns gestores que não praticam nem a participação, nem a pluralidade e muito menos a transparência. Se queremos fazer parte de um valor universal que dê sentido à nossa presença neste espaço e neste tempo, deveremos responder a esta agressão contra as nossas crianças, os nossos pais e avós.

Então, o que fazemos? Aceitamos a pobreza e cada um defende a sua parcela, com a equívoca crença que salvará o seu barco ou juntamo-nos com a certeza de que podemos travar esta cadeia de irresponsabilidades?

Pela minha parte, não acredito na seriedade e lucidez desta gente que nunca acerta, nem mesmo quando se engana e levanto a voz pela demissão do governo, repudiando todas as medidas que resultam no roubo continuado e desigual dos rendimentos do trabalho e no ataque às funções sociais do estado.

Posso perder muita coisa, mas uma coisa é certa, há coisas que não se podem roubar e uma delas é a esperança. E essa não ma tiram. A esperança de que através de uma luta persistente, organizada e consequente é possível travar esta ofensiva, inverter o caminho e derrotar estas políticas. Se não perdermos a esperança haveremos sempre de derrotar a gente que não quer saber da sua gente.

A rua deixou de ser um espaço festivo para converter-se não só na casa de muitos, mas num espaço de luta, onde demonstraremos o nosso desacordo e reivindicaremos a nossa liberdade. E não há tempo de descanso.
E é nessa rua que me podem encontrar!